Na última terça-feira, dia 24 de maio de 2022, foi sancionada pelo Presidente da República a Lei nº 14.344, Lei Henry Borel. O nome da lei faz referência ao menino de 4 anos morto em 2021 após ser espancado no apartamento em que morava com a mãe e o padrasto no Rio de Janeiro.
A Lei protege e resguarda os direitos das crianças e adolescentes com instrumentos de proteção inspirados pela Lei Maria da Penha. Estabelece medidas protetivas específicas para crianças e adolescentes, vítimas de violência doméstica familiar, como o afastamento do agressor do lar e a inclusão da vítima e da família em atendimento de assistência social. Torna inclusive o assassinado de menores de 14 anos crime hediondo, inafiançável. Tais penalizações estão em consonância com nossa Constituição Federal. Cita-se da Lei:
EMENDA: Cria mecanismos para a prevenção e o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente, nos termos do § 8º do art. 226 e do § 4º do art. 227 da Constituição Federal e das disposições específicas previstas em tratados, convenções ou acordos internacionais de que o Brasil seja parte (…)
A Lei traz disposições quanto a forma de configuração da violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente (seja por ação ou omissão), a responsabilidade no tocante a assistência por parte do Poder Público, os deveres no atendimento pela autoridade policial e os procedimentos a serem adotados conforme a complexidade do caso concreto. Citamos das disposições finais:
Art. 27. Fica instituído, em todo o território nacional, o dia 3 de maio de cada ano como Dia Nacional de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Criança e o Adolescente, em homenagem ao menino Henry Borel.
Segundo a Constituição Federal, é dever dos Pais, Sociedade e Estado assegurar à criança ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, direitos fundamentais a eles inerentes.
A proteção integral está norteada pelo princípio do melhor interesse da criança assim como se observa no Art. 3.1 da Convenção sobre os Direitos da Crianças e Adolescente:
Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o melhor interesse da criança.
Essa Convenção teve como meta incentivar o desenvolvimento pleno e harmônico da personalidade das crianças, favorecendo o seu crescimento em ambiente familiar, em clima de felicidade, amor e compreensão, preparando-as plenamente para viverem uma vida individual em sociedade.
Desse contexto é que surgiu a inspiração para o legislador brasileiro elaborar o Estatuto da Criança e Adolescente, o qual dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente. Além disso, apresenta um capítulo específico sobre as medias específicas de proteção que devem ser observadas como prerrogativas dos menores de idade, cabendo destacar o art. 100, parágrafo único, inciso II:
Proteção integral e prioritária: a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida nesta Lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares.
Nesse diapasão Sanches e Veronese referem que o Código Civil, por sua vez, atento as mudanças sociais ocorridas nas instituições familiares, passa a assumir princípios de ordem pública, consagrando a doutrina de proteção integral e o princípio do superior interesse da criança como norteadores, elevando-se à convivência familiar e comunitária ao grau de direito fundamental.
Cabe destacar, que antes mesmo do Estatuto da Criança e Adolescente bem como do Código Civil, a proteção integral já estava expressa na Constituição Federal, mais precisamente no art. 227, o qual destaca ser dever da família, juntamente com a sociedade e o Estado, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, todos os direitos inerentes a pessoa humana, observando a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Dessa forma, a família torna-se, um instrumento para o desenvolvimento digno da personalidade de seus membros, especialmente no que se refere à educação dos filhos, titulares da proteção integral outorgada constitucionalmente.
Como observado, os direitos da proteção integral estão expressos tanto na Constituição Federal quanto no Estatuto da Criança e Adolescente, haja vista tamanha importância desta teoria, a qual desempenha um papel estruturante na sociedade na medida em que reconhece todos os direitos inerentes à pessoa humana, bem como os direitos decorrentes da condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. O que se deve observar, na verdade, quando da interpretação do texto legal, nada mais é do que a proteção dos interesses do menor de idade, os quais deverão sobrepor-se a qualquer outro bem ou interesse juridicamente tutelado, levando em conta a destinação social da lei e o respeito à condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
Sobre o tema a doutrina de proteção integral segundo Antônio Carlos Gomes da Costa na sua obra “Natureza e aplicação do novo Direito da Criança e Adolescente”, refere que:
[…] afirma o valor intrínseco da criança como ser humano; a necessidade de especial respeito à sua condição de pessoa em desenvolvimento; o valor prospectivo da infância e da juventude, como portadora da continuidade do seu povo e da espécie e o reconhecimento da sua vulnerabilidade, o que torna as crianças e adolescentes merecedores de proteção integral por parte da família, da sociedade e do Estado, o qual deverá atuar através de políticas públicas específicas para promoção e defesa dos seus direitos.
Assim sendo, as crianças e adolescentes passaram a ser reconhecidos como titulares de direitos plenos e específicos, que vão muito além dos direitos fundamentais outorgados a todos, isso em razão de sua condição peculiar de vulnerabilidade. É através da proteção integral que se é possível extrair os fundamentos que norteiam o princípio do melhor interesse da criança, já que esse princípio determina a primazia dos direitos e necessidades infanto-juvenis.
Por Fernanda de Bona
Aluna do curso de de pós-graduação em Direito de Família e Sucessões